A terapia como possibilidade de entrega
- Escrito por Regis Furquim Scaggiante
- Publicado em: Terapia
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A fragmentação interna e o ciclo de sofrimento humano
Para evitar as maiores dificuldades o ser humano paralisa determinada função e evita, desta forma, o contato consciente com ela. Este movimento acaba gerando sofrimento pois passa a viver fragmentado. Para voltar a viver de forma inteira, é preciso ser capaz de experimentar de forma completa aquilo que acontece consigo mesmo. Isso significa, estar aberto a vivenciar prazer, amor e alegria com toda intensidade em algumas situações e dor, angustia e tristeza também com toda intensidade em outras.
O funcionamento natural do corpo diante da dor
Ao experimentar, por exemplo, uma situação de dor, o corpo tende a se segurar, se contrair, restringir a respiração e conter através de contrações musculares a percepção completa daquela experiência. Na base destes movimentos estão mecanismos muito primitivos de proteção da vida que funcionam muito bem quando utilizados em momentos nos quais a vida encontra-se ameaçada.
O problema ocorre quando tais mecanismos de proteção passam a ser acionados para evitar, não apenas uma situação real, mas uma memória, uma sensação, um sentimento que foi evitado e retido em uma situação passada. Quando isso ocorre, observam-se sintomas desconectados da realidade atual como por exemplo uma raiva sem justificativa aparente, medos irracionais e sintomas corporais sem motivo identificável.
Como o fator ameaçador nestes casos é interno, faz-se necessária a constante manutenção daquele bloqueio, ou seja, se a contenção for liberada, a sensação e as memórias ali presentes retornarão à consciência.
O grande investimento de energia – Esconder aquilo que não gostamos
Essa constante resistência às próprias sensações, comprometem grande parte de nossa energia vital e de nosso potencial de ação. Uma considerável parcela de energia, que poderia ser investida em criação, expressão, prazer e relações é destinada à manutenção do mecanismo de evitação daquela experiência antiga.
Inicialmente tal esforço é consciente. Sabemos que estamos contraindo nossa garganta para segurar um choro por exemplo. Mas assim como qualquer outro movimento como caminhar, dirigir ou andar de bicicleta, com o passar do tempo, torna-se automatizado e passa a ser realizado de forma involuntária e inconsciente.
Podemos compreender então que, conscientizar-se de tais conteúdos retidos será, à princípio, uma experiência desconfortável. No entanto, podemos compreender também que toda a energia envolvida com a manutenção do bloqueio será liberada de seu comprometimento e estará livre para outras atividades favoráveis à vida como prazer, alegria e criatividade.
Qual a garantia de vantagem na entrega ao desagradável?
Como saber se a alegria e o prazer realmente virão depois de experimentar a dor após o desbloqueio? Pois é… aí entra a importância da entrega. Não é possível saber disso antes. Tais sentimentos e sensações agradáveis não fazem sentido quando não são experimentados corporalmente. É preciso correr o risco. É preciso entregar-se à dor pelo simples fato de reconhecer sua existência. É preciso entregar-se à morte e ao desconhecido. É preciso abrir mão de qualquer expectativa para que a entrega seja genuína. Caso contrário será uma barganha, uma mentira, que definitivamente nada tem a ver com entrega.
A terapia como possibilidade de entrega
A terapia profunda tem o propósito de ajudar a pessoa a reconhecer tais dificuldades e crescer a partir da experiência viva. O terapeuta caminha junto e se dispõe a compartilhar os momentos de angústia durante a jornada. Sabe que após a tempestade vem o sol. Tem a confiança de que a dor é uma professora totalmente confiável. Por isso, ajuda a abrir este caminho, para que o interagente possa crescer com suas próprias experiências.
Já passou por momentos que precisou morrer para reconhecer a grandiosidade de sua vida? Conte-nos através dos comentários.